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quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Exagerada, Haja Coração conseguiu rir e emocionar, mas poderia ter sido melhor



Despretensiosa, simples, com bastante romance açucarado e humor ingênuo e meio infantil. Esta é a fórmula adotada pela direção de teledramaturgia da Globo que colocou a faixa das sete numa curva crescente de audiência desde a estreia de Alto Astral, em 2014. De lá para cá, o público diante da TV no horário só cresceu com I Love Paraisópolis e Totalmente Demais. Todas coloridas, de humor pueril e muitos sonhos. Haja Coração, do mesmo Daniel Ortiz que reergueu a faixa, é mais um êxito no filão, colocando a faixa das sete num patamar de acertos que ela não via há décadas. No passado, era este o horário que mais dava trabalho à Globo; hoje, é a faixa das nove que dá mais dor de cabeça aos Marinhos. Parece que o jogo virou, não é mesmo?

Baseada em Sassaricando, o novelista mudou o perfil de alguns personagens, transformou a coadjuvante de 1987 em protagonista, criou novos tipos e acrescentou tramas. A aposta revelou-se acertada: Haja Coração chega ao fim com média de 27 pontos no Ibope da Grande São Paulo, a mesma da trama anterior no horário, Totalmente Demais. Apesar disto, a qualidade da novela, infelizmente, não acompanhou a audiência, pois a trama promissora logo deu lugar a uma grande barriga, que prejudicou o desenvolvimento da história, repleta de altos e baixos.

Mariana Ximenes, que aceitou a bomba de encarnar uma das personagens mais icônicas da nossa teledramaturgia, sai sob merecidos aplausos. Ela criou sua própria Tancinha e o fez com muita verdade, imprimindo seu carisma ao papel, fazendo uma personagem mais romântica, em comparação com o furacão sensual e bonachão que foi a versão original de Cláudia Raia. A competência de Mariana driblou o estranhamento inicial envolvendo sua escalação. O problema foi a falta de um enredo mais consistente para a feirante ao transformá-la em protagonista.


A trama de Tancinha mostrou-se limitada, resumida à indecisão amorosa entre Apolo e Beto. Para piorar, o caminhoneiro mostrou-se, logo de cara, um sujeito insuportável, marrento e machista, cuja inexpressividade de seu intérprete, Malvino Salvador, só piorou a situação. Enquanto isso, João Baldasserine, com todo seu talento e carisma, fez Beto cair nas graças do público com seu humor involuntário, em face de suas atitudes inicialmente inconsequentes e do sentimento que alimentou ao se apaixonar de verdade. Ainda assim, o grupo de discussão da novela revelou algo surpreendentemente inacreditável: Apolo era o personagem mais querido da novela. Desde então, o autor fez de tudo para forçar sua aceitação, proporcionando um excessivo destaque e prejudicando o enredo de Tancinha. A armação de Beto, que culminou na separação da feirante com o caminhoneiro, foi um golpe baixíssimo para favorecer Apolo!

Além disto, a procura da protagonista pelo pai, Guido, foi abandonada sem qualquer explicação, sendo retomada apenas na reta final. Isto evidencia um equívoco cometido por Ortiz, que foi promover a trama original de Tancinha para protagonista sem reforçá-la com conflitos que a tornassem mais densa; bem como a rivalidade inicial com Fedora, desprezada ao longo dos meses. Elas mal contracenaram, mesmo tendo rendido cenas ótimas juntas. A inimizade da patricinha rica com a feirante pobre tinha tudo para render bastante, o que não ocorreu.

Tarzan e Safira são pegos com a 'boca na botija' (Foto: TV Globo) Teodora fica chocada com o que vê (Foto: TV Globo)

Sem o peso de ser a trama principal, a saga de Varella e da família Abdalla se viu livre para usar e abusar do humor. Neste núcleo, o nonsense imperou. O principal destaque foi Teodora, personagem tão bem defendida por Grace Gianoukas, que acabou escapando da morte (inicialmente, ela morreria para valer, tal como em Sassaricando) e retornando com tudo na reta final. O núcleo, porém, foi prejudicado pela sua falsa morte, que deixou todos os personagens sem função. Com o desaparecimento, a trama passou a andar em círculos, desperdiçando o talento de vários atores envolvidos. Fedora (Tatá Werneck funciona muito mais no improviso), meio perdida no início com aquela história de se tornar a rainha das redes sociais, ganhou substância quando sua parceria com o marido Leozinho (Gabriel Godoy) se fortaleceu; e mais ainda quando surgiu Safira (Cristina Pereira, revivendo a "velha" Fedora de Sassaricando). Teodora, Fedora e Safira protagonizaram excelentes momentos. Pena que Cláudia Jimenez (Lucrécia) e Marcelo Médici (Agilson) acabaram tendo seus talentos desperdiçados.

Deve-se lamentar também o pífio desenvolvimento de Tamara (Cleo Pires), que sofria com transtornos de personalidade. A personagem demorou vários capítulos para aparecer, sendo praticamente uma figurante de luxo. Pouco depois, se envolveu com Apolo, em um relacionamento atraente e repleto de química, tornando o piloto mais tragável. Porém, tudo se esvaiu quando Tamara, que era segura de si, foi transformada em uma mulher obsessiva, no momento em que Apolo se reaproximou de Tancinha para adotar os irmãos Carol, Nicolas e Bia (outra trama mal conduzida que demorou longos meses para acontecer e, enfim, mexer com a trama). A fraca condução do autor prejudicou um dos tipos mais promissores da novela.


Outra trama porcamente desenvolvida foi a de Nair (Ana Carbati) e Adônis (José Loreto canastríssimo), com um plot já manjado na nossa teledramaturgia: o filho que sente vergonha da mãe. Para culminar, só no penúltimo capítulo que Nair soube que o rapaz não usou o seu dinheiro para pagar a faculdade e sim curtir a vida. Outro equívoco que merece ser citado foi o péssimo personagem dado a Conrado Caputo, depois do sucesso do Pepito em Alto Astral. O ator ficou avulso o tempo todo (Renan, no início, era um vlogger fracassado e virou ajudante da cantina de Tancinha), assim como Marcella Valente (Larissa, irmã de Apolo e Adônis).

A história de Giovanni, Camila e Bruna chegou a ter bons momentos, mas também sofreu com a condução equivocada do autor, onde o excesso de bondade da Camila pós-acidente a transformou numa completa idiota. Isso sem falar na facilidade com que ela perdia e recuperava a memória e na cegueira de Giovanni em cima dos surtos de Bruna. Duas situações pra lá de inverossímeis, convenientes apenas para a enrolação do enredo. Apesar dos pesares, destaque para a atuação de Fernanda Vasconcellos, que driblou o fraco desenvolvimento do roteiro e chamou atenção pela versatilidade, vivendo uma vilã psicopata após várias mocinhas seguidas.

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O roteiro do trio de amigas, juntamente com a empregada Dinalda (Renata Augusto), se mostrou limitado para tantos meses no ar. O resultado foi a perda de destaque delas, incluindo a inserção de Rebeca (Malu Mader) em repetitivas e tediosas idas e vindas com Aparício, a separando sutilmente das demais. A única que conseguiu manter situações atrativas foi Leonora, que passou a formar uma dupla com Dinalda, protagonizando divertidas cenas em busca da fama. Ellen Roche sambou na cara de muita gente e mostrou que pode viver papéis que não explorem só seu corpo. A participação da ex-BBB Ana Paula deu um gás para o núcleo. Já Penélope (Carolina Ferraz) formou um lindo casal com Henrique (Nando Rodrigues), mas os dois acabaram ficando de lado após Beto descobrir que o melhor amigo estava namorando sua mãe, sem grandes conflitos. Só nas semanas finais houve a entrada da mãe esnobe do rapaz (vivida pela Sônia Lima), proporcionando boas cenas com a futura nora, ambas quase da mesma idade. Mas era tarde e a falta de aproveitamento de um casal que havia funcionado ficou claro.


A história mais bem-conduzida da trama foi a do casal Shirlei e Felipe. Sabrina Petraglia e Marcos Pitombo esbanjaram química, gerando uma enorme torcida e se tornando o maior destaque da novela, apesar de, em alguns momentos, a ingenuidade excessiva de Shirlei e o tom romântico de conto de fadas ter esbarrado no piegas, com direito a duas vilãs perversas: Jéssica e Carmela (Karen Junqueira e Chandelly Braz ótimas). Marisa Orth e Paulo Tiefenthaler também formaram um casal adorável como Francesca e Rodrigo, principalmente em relação às "maluquices" dele (que sofria de TOC). Marisa, aliás, se saiu muitíssimo bem no drama.

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As loucuras de Fedora para conseguir mais seguidores na internet. O filho mau-caráter que rejeita e engana a mãe pobre e batalhadora. O príncipe encantado que coloca o sapatinho de cristal (no caso, bota ortopédica) na Cinderela. As vilãs terrivelmente más e diabólicas. As aulas de balé que Tancinha fazia, onde sofria bullying das colegas; bem como as armações de Fedora e Leozinho para sabotar a cantina da feirante, como se disfarçar de velhinhos e criar uma guerra de cupcakes, e as brigas ao estilo pastelão entre as duas. Haja Coração passou longe do sútil e apostou na ótica do exagero, pesando a mão tanto no melodrama, quanto na comédia. Ainda sim, mesmo que decepcionando pelo desenvolvimento fraco de várias tramas que poderiam tornar a novela ainda melhor do que foi, conseguiu divertir e emocionar sem deprimir o telespectador que liga a TV às 7 da noite querendo assistir a algo leve e efêmero.

Um comentário:

  1. Haja Coração foi uma novela que so nao fracassou, porque o elenco era muito bom, mas a condução e o texto de Daniel Ortiz foi de uma mediocridade imensa. Pra mim o que fez valer , apesar, da perda de força(culpa de Ortiz) foi o quarteto Malu, Carolina, Ellen e Renata que estavam totalmente a vontade e excelentes em seus. papeis. Se quiser chegar ao horario nobre o autor vai ter melhorar muito e deixar os clássicos em paz. Que Sassaricando ganhe urgentemente uma reprise no Viva para quem nao assistiu tirar a péssima impressão que o seu suposto remake deixou.

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