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sábado, 9 de julho de 2016

Velho Chico empolga quando carrega no drama com tintas de tragédia grega



Que Velho Chico é uma produção bonita e caprichada, nunca restou dúvida quanto a isso. Elenco, direção, fotografia, trilha sonora, maquiagem, figurinos, arte... Tudo foi pensado nos mínimos detalhes, formando um conjunto primoroso na telinha de encher os olhos. Pelo menos, esteticamente falando. Tudo se destaca na novela. Menos a história. Com números modestos de audiência (entre 26 e 30 pontos), Velho Chico não acontece, pouco repercute, não gera burburinho. Entretanto, aos que não desistiram da novela das nove, é notório que ela saiu de seu leito plácido e melhorou bastante. Está mais ágil. Ainda tem muito mais blá blá blá do que ação, é verdade, mas as tramas já começaram a ficar mais interessantes e despertar a atenção.

A mensagem visual anacrônica e inverosímel e a discrepância entre alguns atores da terceira fase em substituição com os da segunda, como Antonio Fagundes e seu Afrânio completamente diferente ao do Rodrigo Santoro (falei disso bem AQUI), já não incomodam mais tanto assim como antes. A passagem para a atualidade foi chocante, mas, com o tempo, alguns elementos foram suavizados, outros, acabamos nos acostumando (ou não). Nas últimas semanas, a novela vem entrando numa crescente com ganchos, embates, sequências e diálogos mais rápidos, perturbadores e antológicos, de tirar o fôlego, parecendo disposta a resgatar aquele desejo que tínhamos nas duas primeiras fases de correr para a TV quando a novela começa.

Santo entra na cocheira da fazenda e se desespera ao ver Olívia e Miguel juntos (Foto: Inácio Moraes/ Gshow)

Velho Chico entrou em seu melhor momento desde a estréia e nos presenteou com uma semana onde as emoções (dos personagens e do público) estiveram à flor da pele. No capítulo de segunda-feira (04), finalmente, Tereza revelou a Santo que Miguel é seu filho. Disposto a impedir que um incesto aconteça, ele sai em disparada atrás da filha, Olívia, e consegue chegar bem a tempo de impedi-la de beijar o próprio meio-irmão. Miguel e Olívia estavam começando a se envolver, mas não sabiam que eram filhos do mesmo pai. Quando a verdade lhes é revelada, o choque e a revolta é grande. Vale frisar que Olívia pode não ser filha de Santo e sim fruto de um caso extraconjugal de Luzia. Os dois, porém, já no capítulo de terça (05), decidem guardar esse amor dentro deles e se unem como irmãos. Foi um capítulo emocionante e muito bonito.

Notícia sobre Miguel deixa família de Santo emocionada  (Foto: Inpacio Moraes/Gshow)

Na quarta (06), outro aguardado desdobramento: o anúncio que Santo fez para a sua família sobre a paternidade recém-descoberta. Santo recebeu Miguel na mesa, com a família, pela primeira vez. A presença do rapaz deixou Bento indignado, afinal, estaria fazendo uma refeição íntima com o inimigo de sua família. Foram várias sequências e chaves de emoção acionadas até que tudo se esclarecesse e o amor fraterno viesse à tona, atualizando todos os sentimentos de cada um. Mais um ótimo capítulo. Com Miguel, o neto querido de Afrânio, deixando a casa do avô e indo viver com a família do pai, o ódio hereditário entre os Dos Anjos e os De Sá Ribeiro ressurgiu com força total, com Afrânio pisando, de arma em punho, na fazenda dos rivais.


E eis que Velho Chico chegou ao auge da emoção bem na quinta (07), justamente, no seu centésimo capítulo. Foi poesia pura o enfrentamento olho no olho, sem uma palavra sequer, entre Afrânio e Piedade. No melhor momento, a matriarca do clã Dos Anjos tomou o revólver empunhado por Bento contra o coronel, o colocou no chão batido e jogou um ramo de delicadas flores sobre a arma. Diante de uma mulher tão forte e de um gesto de nobreza ímpar, Afrânio baixa sua arma e também a deposita perto das flores. Minutos mais tarde, após os revólveres terem sido recolhidos, Bento, Santo e Miguel desenham com os pés um triângulo em volta das flores, selando o pacto de honra e proteção entre eles. Vale ressaltar ainda a qualidade dos diálogos. Especialmente, o discurso arrogante de Afrânio, em conflito interno com a fragilidade emocional camuflado nas intenções do personagem, ferido pela rejeição do neto querido, Miguel. O desfecho da sequência não foi menos sublime: Piedade pede uma vassoura e sai varrendo o pedaço de terra no qual pisara Afrânio e seus capangas. Ela grita dolorosamente em defesa de sua família e contra o inimigo histórico, enquanto levanta poeira sobre si mesma.

Miguel assume a briga de Afrânio para si (Foto: Inácio Moraes/ Gshow)

Trechos desse primor artístico redimem os equívocos e o ritmo arrastado vistos ao longo dessa centena de capítulos de Velho Chico. Os atores envolvidos (todos perfeitos) pareciam estar comovidos para além da ficção. Camila Pitanga, Antonio Fagundes (aqui cabe uma menção especial para esses dois porque eles entraram na trama acima do tom, melhoraram e hoje estão dando um show), Domingos Montagner, Gabriel Leone, Lucy Alves, Giullia Buscacio, Lee Taylor, Irandhir Santos, Dira Paes, Lucas Veloso e Zezita Matos estiveram profundamente mergulhados na essência de seus personagens e conseguiram transmitir tanta emoção com gestos mínimos.

Velho Chico tem o seu ritmo próprio de conduzir suas histórias, mas é justamente quando carrega no drama que fica imperdível. É uma novela tragédia, onde as situações suscitam o terror e a piedade e os personagens vivem em constante estado de tristeza, ódio e desgraça, em penúria sentimental, sem vida pulsante, todos bem densos em dramaticidade e escassos de bom humor, onde a qualquer momento um acontecimento trágico pudesse vir a acontecer. Por isso, todo esse tom teatral e lúdico acaba combinando com a proposta da novela, cuja tragédia grega acaba virando poesia. Que Velho Chico siga nesse caminho e não volte a ser Velho Sono!

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