Falar de Malhação é um caso sério. A novelinha completou 20 anos em 2015 e já exibiu uma avalanche de temáticas e histórias que, involuntariamente, são novamente contadas, mas de um jeito diferente. Por isso, sempre há um grande risco de cair naquela repetição cansativa e deixar o público com a falsa impressão de que é mais do mesmo. Entretanto, os autores de Malhação Sonhos, Rosane Svartman e Paulo Halm, que, curiosamente, também escrevam a ótima temporada Intensa (2012), conseguiram construir uma história repleta de bons dramas, casais cativantes, ótimo elenco e personagens carismáticos. A novela estreou com a ingrata missão de substituir a péssima temporada Casa Cheia e elevar os baixos índices da faixa. Não só elevou a audiência da novelinha teen (ela fechou com média geral de 16 pontos contra 14 da antecessora; e chegou até a ultrapassar a própria novela das nove, Babilônia, em alguns estados por diversas vezes) como também recuperou o prestígio dos anos gloriosos e foi um enorme sucesso nas redes sociais.
O tema principal desta temporada de Malhação foi os grandes sonhos dos personagens e a determinação deles para conquistá-los. Para mostrar os sonhos desses jovens, os autores usaram como cenários principais uma academia de artes marciais (a do Gael, que ainda rivalizava com a Khan) e uma escola de artes (a Ribalta) com músicos, dançarinos e atores. Colocar como pano de fundo esses dois universos completamente distintos entre si, mas, ao mesmo tempo, semelhantes em alguns aspectos, foi uma sacada de mestre. Porém, a história de jovens irem em busca de seus sonhos foi totalmente ofuscada pelos casais da trama. Os autores optaram por mostrar relacionamentos de pessoas com personalidades, objetivos e vidas diferentes. Com isso, os casais acabaram tendo muitos conflitos, reviravoltas e até mesmo troca de parceiros. E este fato acabou excitando e estingando o público a torcer loucamente pelo seu casal favorito. A premissa inicial dessa Malhação também era que os protagonistas da temporada seriam Duca (Arthur Aguiar), Bianca (Bruna Hamú) e Karina (Isabella Santoni). Os três iam viver um triângulo amoroso em que as duas irmãs brigariam pelo mesmo cara. Entretanto, logo no começo, essa história não se sustentou por muito tempo porque Karina era muito mais nova que Duca, que só a via como irmã, e o lutador era completamente apaixonado por Bianca. Aí Karina conhece Pedro (Rafael Vitti) e, entre tapas e beijos, eles se apaixonaram. Não só se apaixonaram como se tornaram o casal queridinho do público e o mais popular dessa temporada. O que acabou alçando Isabella Santoni ao posto de protagonista. O casal Perina ofuscou completamente Duanca, o verdadeiro casal de mocinhos.
Os conflitos amorosos da novela também fizeram com que alguns temas úteis e socioeducativos ficassem de lado. Um belo exemplo disso foi a trama de Mari (Maria Luiza Campos), uma adolescente do interior que foi para a cidade grande para estudar canto, mas acabou descobrindo que estava grávida. Outra história que não foi muito bem explorada foi a de Jade (Anajú Dorigon), que sofria de tricotilomania (distúrbio de controle de impulsos que faz a própria pessoa arrancar os fios do seu cabelo para controlar a ansiedade e o nervosismo). Esses dois assuntos poderiam ter rendido bastante, mas foram abordados superficialmente e nenhum deles ganhou sua devida importância. Faltou alertar e conscientizar o público teen que a gravidez na adolescência não é esse mar de rosas todo (ainda mais se tratando de uma garota pobre) e a automutilação é um caso sério e não uma simples rebeldia como foi mostrada. Por outro lado, temas como câncer de mama (através da luta de Lucrécia, personagem de Helena Fernandes, pela cura da doença; mostrada de forma sensível e emocionante e cuja cena dela mostrando os seios fazendo um autoexame gerou grande repercussão), machismo (em virtude das atitudes de Duca e Gael em relação ao desejo de Bianca ser atriz e no de Karina em ser lutadora), liberdade de expressão, racismo (através de Rico e, também, quando Sol e Wallace melhoraram de vida), homofobia (vista no pai de Jeff, que não queria que o filho se tornasse dançarino porque "isso é coisa de viado"), lutas ilegais e esquema de apostas foram muito bem retratados nesta temporada.
Malhação Sonhos estreou em 14 de julho de 2014 e terminou ontem (14 de agosto de 2015), com um total de 280 capítulos. Segurar uma história por mais de um ano é sempre uma tarefa bastante complicada e foi aí que a trama escorregou. A evolução dos personagens foi bem mostrada. Jade (Anaju Dorigon) e Cobra (Felipe Simas), inicialmente apresentados como duas pestes, foram mudando ao longo da trama. De vilã, Jade se mostrou uma garota problemática que precisava de atenção. Sua mudança em decorrência da grave doença da mãe, com quem ela tinha uma relação complicada, foi uma das melhores partes da trama. A redenção de Cobra, por amor à Jade, também. A dupla foi ganhando espaço aos poucos e se tornou um dos melhores casais da novela (particularmente, foi o que mais gostei). O mesmo aconteceu com a misteriosa lutadora Nat (Maria Joana), que entrou no meio da trama e se revelou uma das personagens mais interessantes dessa temporada, cheia de dualidades, principalmente quando começou seu romance com Duca e se envolveu com Lobão (Marcelo Farias) para desvendar o esquema ilegal da Khan. O problema é que estragaram esses três personagens citados na reta final. O casal Cobrade casou duas semanas antes do término e não teve mais função (Cobra desapareceu e, nem no último capítulo, ele e Jade tiveram uma cena juntos) e Nat entrou numa trama absurda de perda de memória que acabou como se fosse vilã. E o que dizer da história da "Morena bandida"? Nanda Costa entrou aos quarenta e cinco do segundo tempo só pra acabar com a Ribalta. Uma trama desnecessária! Se Malhação Sonhos tivesse acabado há, pelo menos, uma semana atrás, teria sido muito melhor!
Em relação ao elenco, essa temporada apresentou uma das melhores escalações de toda a história da Malhação. Isabella Santoni (Karina) foi o grande destaque dessa temporada (ela chegou até a ganhar o prêmio de revelação do ano no Troféu Imprensa). Isabella terá um futuro muito promissor pela frente (a atriz, inclusive, já está escalada para Ligações Perigosas, minissérie que estreia em janeiro de 2016 na Globo). Anaju Dorigon (Jade) esteve impecável do início ao fim . Felipe Simas (Cobra) estava muito inexpressivo no começo, mas, ao longo dos meses, foi evoluindo e acertou no tom. Jeniffer Nascimento (Sol) e Maria Luiza (Mari) são talentosíssimas e arrasaram tanto nas cenas musicais quanto nas cenas mais dramáticas. Arthur Aguiar (Duca) e Bruna Hamú (Bianca), apesar de terem sido ofuscados pelo casal Perina, estiveram corretos e mandaram bem. Maria Joana (Nat), Rafael Vitti (Pedro), Guilherme Hamacek (João) e Yasmin Gomlevsky (Joaquina) também merecem ser mencionados. E não foi só o elenco jovem que se destacou. Os veteranos Eriberto Leão (Gael), Marcelo Faria (Lobão), Patrícia França (Delma), Emanuelle Araújo (Dandara), Helena Fernandes (Lucrécia), Guilherme Piva (Edgar), Mário Frias (René), Léo Jaime (Nando) Odilon Wagner (Heideguer), Iná de Carvalho (Dona Dalva), Edvana Carvalho (Bete) e Edmilson Barros (Lincoln) formaram uma ótima parceira com os mais novatos.
Mesmo com todos esses equívocos mencionados, foi uma boa temporada, optando pela interação entre público e elenco, que envolveram escolhas de músicas e gravações de clipes e concursos para escolha de duas fan fictions (histórias criadas por fãs que funcionam paralelas à trama principal). Por fim, Malhação Sonhos chega ao fim deixando profundas saudades no público e se consagra como uma das melhores temporadas da novelinha teen de todos os tempos!
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Bora comentar, pessoal!