Não perca nenhum dos nossos posts

terça-feira, 26 de abril de 2016

'Velho Chico' e essa mania irritante do Luiz Fernando Carvalho em transformar tudo em 'Hoje É Dia de Maria'



Numa cidade interiorana, um coronel manda e desmanda na região e abusa do poder para manipular as pessoas carentes de ensino e informação. O coronelismo mascarado na política. Grilagem de terras. Um discurso inflamado sobre a importância do voto e a obrigação do povo de cobrar as promessas feitas pelos governantes. Pessoas desiludidas com o próprio país diante de tanta desigualdade social. Discussões calorosas sobre o uso abusivo de agrotóxicos. De um lado, os que rejeitam o uso do veneno por questões que envolvem saúde e abuso na tributação. Do outro, os que só pensam no lucro.

Como se vê, Velho Chico tem um pé fincado com força no realismo. Ainda mais se levarmos em conta que estamos numa época de ânimos exaltados na política da vida real. Um Coronel que defende seus interesses econômicos às margens do Rio São Francisco e tem conflitos com defensores do meio ambiente é uma temática interessante e atualíssima, vide a tragédia ecológica e humana de Mariana e das cidades ao longo do Rio Doce. Quer dizer, pelo menos, é isso que indica o texto. A mensagem visual, entretanto, é completamente outra: antiquada, anacrônica, confusa e inverosímel.


Velho Chico dá a impressão de estar perdida no tempo. Afinal de contas, aquela fazenda dos de Sá Ribeiro e aquelas pessoas que vivem na cidade estão em que década? O jeito como eles se portam é completamente datada, digna da década de 1930. O tom fantasioso na primeira fase (ambientada no final dos anos 60), não causou tanto estranhamento porque se passava numa época bem propícia para a exploração do lado lúdico do diretor Luiz Fernando Carvalho. Agora, teoricamente, a trama se passa em 2016. Porém, apesar de ter seguido uma cronologia até então, Velho Chico mergulhou em um universo paralelo atemporal e, ao contrário do que se imaginava, o grau de esquisitices só aumentou.

Se houve passagem de tempo, não parece. Os carros são antigos. Os figurinos, extravagantes: as pessoas humildes vestem roupas voltadas para o bege, azul claro e cores mais discretas ou neutras; enquanto a família Sá Ribeiro está mergulhada em um mundo colorido, repleto de tons chamativos. Com seus turbantes e vestimentas de época, as empregadas da novela (TODAS NEGRAS) estariam perfeitamente caracterizadas de escravas se estivessem em Escrava Isaura. A decoração da sala dos de Sá Ribeiro mais parece um antiquário com tanta velharia. Parece que todos aqueles personagens habitam um mundo fantasioso. Onde que no calor escaldante do sertão alguém vai ficar vestida toda de preta (parecendo a Rainha Má) até o pescoço que nem a Encarnação (Selma Egrei)? Onde que alguém vai ficar passeando pela lavoura com vestidos longos e vaporosos como os da Maria Tereza (Camila Pitanga)? E o que dizer de Santo (Domingos Montagner), que mais parece um imigrante italiano do século XX com aqueles coletes e bombachas? Existe alguém que use aquele penteado de Iolanda (Christiane Torloni) atualmente? E aqueles ternos do Coronel Afrânio (Antonio Fagundes) que mais parecem terem sido tirados do guarda-roupas do Falcão? Alô, alô, Esquadrão da Moda!


Entendo que o autor esteja usando elementos característicos de novela clássica, de um imaginário que está na mente dos brasileiros, mas é algo que destoa totalmente da realidade. E o elenco da segunda fase também confirma isso. O bom vivant, mulherengo e estudante de direito, que se viu obrigado a assumir os negócios da fazenda com a morte do pai, se transformou em um autoritário e debochado coronel. As mudanças do Coronel Afrânio foram além do cabelo (de encaracolado para liso) e do estilo de roupa, mas afetaram a própria personalidade do personagem (leia mais aqui). A impressão que dá é que o Fagundes não assistiu aos capítulos com Rodrigo Santoro (e se assistiu, não se importou nem um pouco em mudar radicalmente o jeito do personagem). O mesmo vale para a Torloni, que transformou a Iolanda da Carol Castro numa perua, daquelas que a atriz sempre interpreta na TV.

A maioria dos atores da primeira fase foram substituídos por outros, no mínimo, parecidos, com exceção do personagem Cícero, que conseguiu mudar a cor dos olhos em duas ocasiões: castanhos, quando menino; verdes com Pablo Morais; e de novo castanhos com Marcos Palmeira. Alguém se esqueceu de comprar lentes de contato pros atores, hein... Carlos Eduardo, de Marcelo Serrado, em nada lembra o de Rafael Vitti e mais parece ter saído diretamente dos sets de Gabriela. Ainda há um Tonico Bastos ali dentro. Pelo menos, naquela novela, ele era engraçado. Na primeira fase, Maria Tereza deveria estar na faixa dos 16 anos. Vinte e oito anos depois, a atriz Julia Dalavia sai da cena para entrar Camila Pitanga no lugar da personagem, que na trama já teria 44 anos. Muito inverossímil, levando-se em consideração que Pitanga está com 38 anos. Mais surreal ainda pensar que a personagem tem um filho de 28 anos, apenas 10 anos a menos do que a atriz na vida real.


Sabemos que as novelas são obras de ficção e qualquer semelhança com fatos ou pessoas da vida real são meras coincidências. Mas geralmente elas costumam ser ficções mais próximas da realidade. Ou bem distantes (realismo fantástico/ficção científica). Essa novela, porém, não sabe onde se encaixa. Pela primeira vez, está havendo uma discrepância enorme entre a direção de Luiz Fernando Carvalho e o texto/enredo de Benedito Ruy Barbosa. Fui um dos defensores da ideia de termos de volta uma novela rural às nove, mas esperava uma trama visualmente bonita e, de fato, rural como O Rei do Gado ou Pantanal, da mesma dupla. Mas o diretor pensa o contrário e resolveu apostar num estilo lúdico, sonhador, poético e nada convencional (o que já virou a marca registrada do Luiz).

O problema é que, nos últimos anos, em todo trabalho que dirige ele pegou uma mania irritante de quer transformar tudo em uma nova Hoje É Dia de Maria (minissérie que primou pela linguagem e pela estética inovadora). Deu certo na maravilhosa Meu Pedacinho de Chão, um lindo conto de fadas que primou pela fantasia sob o olhar de uma criança e onde o lúdico se fez presente do início ao fim. Mas esses elementos mais fantasiosos e líricos não combinam numa trama que se pretende ser rural, realista e contemporânea. A produção acaba ficando confusa e vira um grande devaneio. Esse é o caso de Velho Chico. Alguém precisa cortar as asinhas de Luiz Fernando Carvalho e salvar (enquanto é tempo) a atual novela das nove dessas suas invencionices que só atrapalharam. A menos que a trama se assuma como uma fábula do coronelismo brasileiro. O que não parece que seja o caso.



Depois de Carminha vs Nina, o Eu Critico Tu Criticas trará mais uma trama na nossa fan page cujo eixo central é a rivalidade entre duas mulheres. De um lado, a trajetória da dissimulada Laura em se aproximar da poderosa Maria Clara dizendo ser sua maior fã para roubar tudo que ela tem; do outro, a psicopata Flora, que nutre um amor doentio com inveja obsessiva pela ex-amiga Donatela e faz de tudo para destruí-la. Dois grandes sucessos. Qual você escolhe: Celebridade ou A FavoritaVota lá!

 


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Bora comentar, pessoal!

Poderá gostar também de

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...